Os números e a humanidade (I)

O primeiro jogo de um campeonato sempre é complicado para ambas as equipes, mesmo se uma delas for pentacampeã mundial da modalidade. Então, quando o jogo é solitário e o competidor nunca foi sequer um penúltimo colocado, o embate é muito mais difícil. Trata-se do caso do primeiro artigo do autor deste texto para o Jornal da Comunidade, originado de uma desinteressada troca de comentários com o editor Washington Sidney a respeito de um ensaio seu publicado na notável coluna Eureka! Convite feito, desafio aceito. Se alguém encontrar este texto publicado no prestigioso periódico estará provado que passei no vestibular, mesmo que a façanha não se repita.



Considerei a escolha de um assunto apropriado ponto importante no teste e optei pelo ensino da matemática; atende ao objetivo geral do caderno, educação, e ao particular, ciência. Atende, também, a uma necessidade estratégica do país, que precisa se tornar independente, científica e tecnologicamente, para poder candidatar-se ao vestibular de membro do exigente clube das nações do primeiro mundo. Como motivação secundária, considerei dois fatos de meu conhecimento: o primeiro, a respeito de alguém avesso à matemática que folheou um livro e exclamou: “Gostei deste; não tem equações!” O segundo, sobre os dissabores de um professor de matemática 2 (funções com duas variáveis), num curso para estudantes de “ciências meio-exatas”. Como o professor exigia dos alunos, como pré-requisito, conhecimentos de matemática 1 (funções com uma variável) e a maioria não sabia sequer “matemática 0”, houve conflito com a direção da faculdade, que considerava cada aluno como cliente e, portanto, com o direito assegurado ao diploma que estava sendo “financiado” em “suaves” mensalidades. É difícil imaginar como seria um curso de física de partículas, nessa instituição de ensino “superior”, perante a necessidade de uma disciplina de “matemática 11”.




Uma dosagem adequada de matemática no currículo de qualquer curso superior é uma necessidade absoluta; na educação básica, também. Na era da globalização, o conhecimento é a mais valiosa commodity e não há pesquisa, atividade que gera conhecimentos, que prescinda da matemática, no mínimo como instrumento para medição dos fenômenos estudados, sejam sociais, científicos ou de qualquer natureza.




Para concluir, apresento uma sugestão de tema de trabalho de pós-graduação a bacharéis em “ciências não-exatas”: a importância dos números para o desenvolvimento da humanidade. A história, como ciência, existe apenas há cerca de seis mil anos, a partir de quando os sumérios inventaram a escrita. No entanto, o osso de Ishango, peça com 15 a 20 mil anos, evidencia que na era paleolítica a humanidade já usava artefatos para a representação de números e operações aritméticas simples. Os entalhes sugerem o instigante conhecimento sobre números primos, ainda hoje um dos assuntos mais complexos da teoria dos números. Deixo a seguinte pergunta para meditação: a humanidade teria aprendido a escrever se antes não houvesse aprendido a contar?

Informações sobre o osso de Ishango: http://pt.wikipedia.org/wiki/Osso_de_Ishango

Página de abertura do blog: http://www.kosmologblog.blogspot.com/



Publicado no Jornal da Comunidade, na edição de 25/10 a 1º/11 de 2008, no caderno Educação & Ciência, página 14. A ilustração é de autoria não divulgada pela editoria do periódico.



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